Condomínio residencial da CRH Empreendimentos e Participações S/A, denominado “Paraíso das Araucárias” pode se transformar no “inferno” de 1.645 árvores
A araucária, ou pinheiro brasileiro (Araucaria angustifolia), garante a sobrevivência de muitas espécies da fauna e flora. Suas folhas, sementes e madeira são importantes para manter o equilíbrio do ecossistema. É tamanha a sua importância que em 2005, por meio de um decreto presidencial, criou-se o Dia Nacional da Araucária, comemorado em 24 de junho.
Ambientalistas estão inconformados com recente decisão judicial que permitiu o corte da espécie considerada em perigo crítico de extinção pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN).
Brechas em normativas e de fiscalização aumentam as chances de que ela desapareça das paisagens nacionais nas próximas décadas. E o empreendimento imobiliário de Campo Alegre, SC, dá enorme contribuição para isso.
Parecer técnico de relatório de vistoria do Consórcio Intermunicipal Quiriri (CIQ), de “Supressão de vegetação nativa em área urbana para fins de parcelamento de solo (condomínio de lotes)”, de 13 de setembro de 2024, aponta para o indeferimento do empreendimento “indicando desconformidades com a legislação”, o que foi acatado pelo órgão ambiental do município.
Todavia, no dia 07 de novembro de 2024, o Juiz de Direito Marcus Alexsander Dexheimer, da 1a Vara Cível da Comarca de São Bento do Sul, determinou decisão liminar favorável ao empreendimento alegando que “os fundamentos que levaram o órgão técnico a proferir parecer desfavorável ao licenciamento do projeto não se sustentam frente ao regramento jurídico vigente, de sorte que não podem ser utilizados pelo Poder Público municipal para indeferir a Licença Ambiental de Instalação do empreendimento”.
A reação do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) foi imediata contra a liminar. No dia seguinte, o Promotor de Justiça Thiago Alceu Nart ingressou com embargos de declaração argumentando que a concessão de licença pretendida resultará na supressão de espécie ameaçada de extinção. “Assim, é evidente que a decisão proferida, em sede de tutela de urgência, implica em dano irreversível ao meio ambiente”.
O promotor argumenta que conceder a tutela de urgência para o empreendimento “fulmina o interesse na referida discussão, pois o dano ambiental (mesmo que a ação seja julgada improcedente) já estará consumado” e considera a omissão do juízo a análise do perigo de dano e da irreversibilidade, o que justifica como necessários os embargos.
A posterior decisão favorável, em harmonia com o MPSC, do Juiz de Direito Felipe Nobrega da Silva considera a “relevância dos fundamentos apresentados pelo Ministério Público, bem como tendo em vista risco de dano grave ou de difícil reparação”.
Ambientalistas comemoram a mais recente decisão judicial, mas temem a vitória do empreendedor no desenrolar do processo. “A sociedade precisa se unir em defesa do meio ambiente. O caos ambiental que estamos presenciando tem como culpados leis inadequadas, casuísticas e decisões judiciais equivocadas. Precisamos impedir o corte destas araucárias”, conclama Julium Schramm, do Observatório Ambiental.
Faz coro o presidente do Instituto Viva a Cidade (IVC). “Neste momento crítico é imprescindível que o desenvolvimento econômico aconteça de maneira sustentável, harmonizando a geração de empregos e renda com a proteção dos nossos biomas e patrimônios naturais. A preservação das araucárias é vital não apenas para a biodiversidade que conhecemos hoje, mas também para assegurar que as futuras gerações tenham acesso aos recursos valiosos que esse ecossistema oferece”, defende Thiago Zschornack.
O promotor resume a sua manifestação. “Uma vez implementado o corte das árvores em extinção, o dano ao meio ambiente é irreversível. Portanto, a decisão liminar do Poder Judiciário, que na prática autorizou o corte da vegetação nativa, deve ser revista, pois não levou em consideração que os efeitos dela são irreversíveis e a própria legislação veda decisões liminares irreversíveis, ainda mais em prejuízo do meio ambiente. O que o Ministério Público busca, nesse momento, é que a decisão do Poder Judiciário pelo corte ou não da vegetação nativa só ocorra com muita segurança no final do processo, depois do caso ser completamente debatido e analisado. Muito preocupa o Ministério Público a possibilidade de o Poder Judiciário decidir, ao final do processo, que o órgão ambiental tinha razão de não autorizar o corte da vegetação nativa se esse corte já tiver sido realizado de forma precipitada”, pondera Thiago Alceu Nart.
A araucária possui madeira de excelente qualidade e o seu fruto, o pinhão, tem alto valor nutricional. Por suas características econômicas, a árvore foi exaustivamente explorada sendo incluída na lista das espécies ameaçadas de extinção. A extensão das florestas dessa espécie diminuiu 98%, de 182 mil km2 para 3,6 mil km2. Estudos alertam que a araucária pode desaparecer em menos de 50 anos se decisões, como a recente, forem normalizadas no judiciário.
A valoração econômica dos recursos ecossistêmicos do bioma concentrado de araucárias é inestimável. Até o início do século XX o pinheiro-brasileiro dominava as paisagens do sul do Brasil. As florestas de araucária distribuíam-se pelo Paraná (40% da área original), Santa Catarina (30%) e Rio Grande do Sul (25%). Outros estados também premiavam a natureza com alguns remanescentes; São Paulo (3%), Rio de Janeiro (1%) e Minas Gerais (1%).
Fizemos contato com o representante, legal da CRH Empreendimentos e Participações S/A, que tem sede à rua Xavantes, 54, em Joinville, SC. Decorridos alguns dias, até o fechamento dessa matéria, não tivemos respostas.
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