"As redes sociais dão voz à uma legião de imbecis. Normalmente, os imbecis eram imediatamente calados, mas agora eles têm o mesmo direito à palavra que um Prêmio Nobel".
A afirmação atribuída à Humberto Eco quando recebera seu título de Dr. Honoris Causa em Comunicação na comunidade de Turim em 2015, foi destacada na abertura do I Congresso de Ciências Criminais por um dos seus idealizadores, Lauro Joppert Swensson, da Escola Superior de Direitos Públicos (ESDP).
O evento, que aconteceu em Dourados, no período de 25 a 27 de abril de 2017, tira o estado do Mato Grosso do Sul dos noticiários criminais e o coloca em destaque como referência na discussão e reflexão sobre o tema nos campos da Violência Contra a Mulher, Sistema Carcerário e Corrupção.
Swensson, um jovem advogado com uma visão de mundo ampliada por estudos e especializações na Europa, cativa pelo sorriso fácil apesar de atuar numa atividade profissional marcada pela tensão. Bastam poucos minutos de conversa para que se confirme estar diante de um advogado de elevado espírito de humanidade, o que também se caracteriza nos demais parceiros idealizadores do evento, os advogados Ricardo Guilherme Corrêa Silva e Leonardo Schmitt De Bem.
Tive a oportunidade de assistir todas as palestras e mini cursos do evento. Para lá fui com outra intenção. Mas, quis o destino me premiar com esta oportunidade ímpar de conhecer e conviver, por três dias, com tantos especialistas num momento de profunda crise política e de valores pelo qual passa a sociedade brasileira.
O Brasil precisa de mais eventos como esse, para contrapor ao que constata Humberto Eco e que eu concordo plenamente, de o quanto as redes sociais dão vez e voz aos imbecis. Não posso deixar de destacar alguns pontos marcantes, para mim, de cada palestrante:
√ As questões mais controvertidas da Lei Maria da Penha
Alice
Bianchini - Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo (PUC-SP). Integrante do Conselho Especial da Mulher Advogada
da OAB Federal. Diretora e editora do Portal Atualidades do Direito.
Colunista da Escola Superior de Direito Público (ESDP). Autora de vários
livros.
"O Brasil vai cair 40 posições no quadro comparativo da igualdade entre homens e mulheres na política a partir do governo Temer. A afirmação não é uma acusação, mas uma constatação", destacou Alice Bianchini que chocou a plateia de professores, alunos, graduandos e graduados na área do direito, público-alvo majoritário no evento.
Durante sua apresentação, outros números se revelaram tão ou mais assustadores:
√ 95 anos é o tempo que o Brasil vai levar para que haja igualdade entre homens e mulheres (considerando o ritmo atual)
√ 104 anos para a igualdade salarial
√ 40 anos de atraso estão as mulheres em relação aos homens quanto à representação na mídia
√ O Brasil ocupa a posição 79 numa avaliação de desigualdade de gênero em 144 países. Já a Argentina está muito melhor posicionada que nós na posição 33.
√ O Brasil é o 5º País que mais mata mulheres numa lista de 83 países
√ A Lei Maria da Penha é uma das três mais avançadas no mundo, mas o Brasil foi o 18º país da América Latina a ter uma lei de proteção às mulheres
√ O Brasil é formado por uma sociedade machista e 45% das mulheres não se sentem livres para realizar seus sonhos e aspirações
√ 41% das mulheres têm medo de lutar por seus direitos
√ 19% dos homens se acham superiores às mulheres
√ 14% das mulheres acham que os homens são superiores
Para Alice Bianchini, os números revelam uma realidade que basicamente tem uma única razão para tanta disparidade entre gêneros no Brasil. "O desafio é cultural".
√ A república do encarceramento: como nos tornamos tão intolerantes?
Roberto Tardelli - Procurador de Justiça aposentado do Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP). Conferencista e advogado (criminalista) sócio da Banca Tardelli, Giacon e Conway.
"Ninguém prende mais no mundo que o Brasil. Temos nos cárceres (700mil) e nas prisões domiciliares, mais de um milhão de presos. Perdemos para os Estados Unidos da América, que tem uma cultura prisional enlouquecida, para a China e para Rússia", assim começa sua apresentação o conferencista que resgata parte da história do Brasil desde o seu "descobrimento".
Roberto Tardelli contextualiza a plateia demonstrando que o País se constrói na escravidão de negros (principalmente) e índios. "Negros e índios não eram sujeitos de direito, mas objetos de direito, portanto eram coisas. O Brasil tem uma longa história de manipulação contra negros e índios", que persiste.
O especialista se indigna com a justiça que aceita como "perfeitamente possível" a condenação com base exclusiva em depoimentos de policiais. "Isso só é possível no Brasil que ainda tem o agravante de ter o padrão de prova muito baixo e a Polícia Militar é um dos grandes resquícios da ditadura". Ele destaca ainda que que 100% dos presos são da periferia e que 80% deles são negros ou não brancos. "A condenação é certa".
Quando aborda o tema drogas, Tardelli, que foi Promotor da Justiça por 30 anos e fez mais de 1200 júris e defende a discriminalização de todas as drogas, afirma que o inchaço prisional se dá muito por conta do pequeno tráfico. "Vi uma condenação de oito anos de reclusão por porte de 0,8 g de cocaína. Se o flagrante for de uma pedra de crack, é uso. Se quebrar essa pedra, é tráfico. Quem está preso é na sua grande maioria jovem, negro e tem baixa escolaridade".
√ Presos que menstruam
Nana Queiroz - Formada em jornalismo
pela Universidade de São Paulo (USP) e formada em Relações
Internacionais pela Universidade de Brasília (UNB). Escritora e diretora
executiva da Revista AzMina.
"Lugar de bebê não é na cadeia". Para a jornalista Nana Queiroz, autora do livro Presos que menstruam, é inadmissível uma mulher grávida no cárcere. "Além de ferir frontalmente o Estatuto da Criança e do Adolescente, o aprisionamento de mulheres que amamentam é um contrassenso."O uso de tornozeleiras, além de representar custo mensal menor para o Estado, permite que as mães estejam com seus filhos no regime de prisão domiciliar", racionaliza.
Uma de suas pesquisas revela ainda que mais de 50% das mulheres presas foram parar na cadeia por uma relação direta ou indireta de violência doméstica. "Elas sofrem violência doméstica de seus maridos. Então, elas fogem de casa com os filhos. Ganham 30% menos que os homens no mercado de trabalho. Elas tentam. Trabalham mais de doze horas por dia. Não conseguem pagar aluguel e sustentar os filhos. Mas não querem voltar para o marido que pratica violência contra ela e os filhos. Então elas se perguntam: 'Vou vender uma macoinha para o playboyzinho ali na esquina, para que meus filhos tenham uma vida digna, ou deixar meus filhos passando fome?' É balela, que uma mãe vai deixar seus filhos chorarem de fome. Eu também não deixaria".
Ela também confirma que a maioria desta mulheres encarceradas é pobre, negra ou não branca e sofreram na infância e sofrem na vida adulta relacionamentos abusivos, têm baixa escolaridade e não têm autonomia financeira, emocional. "Tudo está neste mesmo balaio. Elas até suportam enquanto a violência é só contra elas. Mas, quando os filhos começam a ser vítimas, quando suas filhas começam a ser estupradas dentro da própria casa, é neste momento que elas se entregam à criminalidade. E é no crime que elas encontram o acolhimento que o Estado não oferece".
Para Nana, humanizar estas pessoas é resgatar a nossa humanidade. "Como a gente trata os nossos presos diz muito mais sobre quem nós somos enquanto sociedade do que sobre quem eles são enquanto criminosos".
√ Direitos no cárcere
Leonardo Schmitt De Bem - Doutor em Direito Penal pela Università degli Studi di Milano (Itália). Doutor em Direitos Fundamentais pela Universidad de Castilla-La Mancha (Espanha). Professor Adjunto na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS). Idealizador da Escola Superior de Direito Público (ESDP). Autor de vários livros.
"O nosso sistema penitenciário é um sistema completamente seletivo". Além das palestras, o I Congresso de Ciências Criminais contou com mini cursos. Direitos no cárcere foi realizado por Leonardo Schmitt De Bem que fez uma radiografia do quanto a justiça brasileira condena muito mais por uma via do direito penal por atos do que pelo fato. "A maioria da população carcerária é negra e pobre. É formada basicamente pela camada socialmente marginalizada. O sistema prisional brasileiro faz uma seletividade de pessoas ao invés da seletividade de condutas".
Além dessa característica seletiva, o cárcere brasileiro pune muito além do que deveria ferindo a Constituição o Código Civil e a Lei de Execução Penal. "O preso deveria perder o direito à liberdade. Os demais direitos, todos, deveriam ser mantidos. Presos não podem ser submetidos à tortura, nem a tratamento desumano ou degradante".
Em seguida, ele projeta três vídeos de noticiários de violência, tortura, humilhação e degradação humana promovidos em presídios e delegacias de Santa Catarina que foram amplamente noticiados.
Para mim, catarinense, estar no evento, naquele momento, foi vergonhoso. Apesar de De Bem enfatizar que essa é uma realidade em todos os estados do País, esse sentimento só foi superado no fim daquela noite com a palestra de outro catarinense, João Marcos Buch. Mas, isso é para depois...
De Bem afirma à plateia que qualquer outro direito suprimido, no cárcere, além da liberdade, é crime. Deve ser denunciado, deve ser punido.
√ Política de drogas e encarceramento feminino
Luciana Boiteux - Doutora em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (USP). Professora associada de Direito Penal e de Criminologia da Faculdade Nacional de Direito (UFRJ). É membro do Conselho Consultivo da REDUC (Rede Brasileira de Redução de Danos e Direitos Humanos). Autora de vários livros.
"Política de drogas é o que mais encarcera mulheres no Brasil". Luciana Boiteux apresentou pesquisa realizada em penitenciárias cariocas com mulheres em situação de maternidade.
Os números apresentados na pesquisa são também assustadores:
√ 70% delas são rés primárias
√ 77% são negras ou pobres
√ 82% são solteiras
√ 50% tinham companheiros presos
√ A maioria tem de 2 a 3 filhos
√ A maioria não pode avisar ninguém que estava sendo presa
√ A maioria não recebe visitas na prisão
√ As que recebem visita, a maior parte é da mãe
Luciana Boiteux destaca que toda gravidez no cárcere é uma gravidez de risco e deveria ser proibida a prisão de mulheres grávidas, como já acontece em muitos países.
O destaque de sua fala foi para o dia de visitas. No presídio masculino, nesse dia, são grandes as filas com esposas, companheiras, mães, avós, crianças etc. "Não têm filas nos presídios femininos nos dias de visita. O companheiro raramente visita. As mulheres encarceradas são abandonadas por eles".
A novidade para 100% da plateia foi as Regras de Bangkok, que trata das regras das Nações Unidas para o tratamento das mulheres presas e medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras. "Muitos juízes brasileiros também não as conhecem, são tratados de direitos internacionais que não são aplicados no Brasil".
√ Enfrentando os navios negreiros do século XXI
João Marcos Buch - Mestre em Ciência Jurídica (Hermenêutica e Principiologia Constitucional) pela Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Especialista em Criminologia e Política Criminal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Juiz de Direito do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC). Membro do Conselho Executivo da Associação Juízes Para Democracia (AJD). Autor de vários livros.
"Eu tenho orgulho da casa que componho, do Poder Judiciário. Me honra muito ser Juiz de Direito. Por outro lado, isso não impede que eu teça críticas à instituição". Assim começou a apresentação do joinvilense João Marcos Buch, a razão pela qual eu estava naquele Congresso, mas que aproveitei para participar de 100% dele.
E como disse no texto anterior que escrevi sobre o mini curso "Direitos no Cárcere", aqui minha alma foi lavada quando Buch olha para a Luciana Boiteux e diz: "Em Joinville, nenhuma mulher grávida, nenhuma mulher com filho abaixo de 12 anos está presa. Ne-nhu-ma. As presas grávidas são provisórias. A partir do momento que ela vai para a execução penal ela vai para casa. Esta é a forma constitucional e legal de se fazer entender. Eu não consigo ver de outra forma".
Foi neste evento que pude conferir o quanto esse respeitado juiz é admirado Brasil afora e comemorado por ser um defensor dos preceitos constitucionais e humanitários. Passei o resto do evento sentindo orgulho de ser joinvilense, de ser catarinense.
"Eu filtro os direitos penais pela Constituição. Eu defendo o direito penal mínimo, o direito penal como última instância alternativa. E se o processo levar à prisão, que seja num local digno e que se cumpra a lei. É isso que eu defendo".
Buch, infelizmente, é a exceção nessa seara. Principalmente nesse momento de grave crise política, ética e de justiça, o ódio se prolifera como uma das piores pragas da nossa sociedade. E o clamor odioso desta sociedade doente encontra ressonância na força policial, nas cadeias, no judiciário. Uma aberração que afronta direitos legais e constitucionais.
Buch fez um pedido aos presentes, de que está na hora da academia ir para a rua com a Constituição nas mãos e dizer "não passarão. Porque os absurdos que nós temos visto, em nome de justiça, com conduções coercitivas, com prisões para delação, isso nós não podemos admitir. O preço que nós vamos pagar será muito alto, porque o chicote muda de mão. E o chicote que está conosco hoje, amanhã pode estar contra".
Depois disso fez uma exposição do sistema prisional, sobre Direitos Humanos, a situação consolidada no Brasil, o direito penal e a execução penal. Ao fim, foi o mais assediado congressista para fotos e conversas com dezenas dos presentes na plateia.
√ Cooptação de agentes públicos: o auge da corrupção
Flávio Cardoso Pereira - Doutor em Direito pela Universidad de Salamanca (Espanha). Pós-doutor em Direito pela Universidade de Coimbra (Portugal). Promotor de Justiça no Estado de Goiás (MPGO). Professor universitário e colunista da Escola Superior de Direito Público (ESDP). Autor de vários livros.
"Eu não sei se estamos no auge da corrupção. Mas, eu creio que estamos muito próximos do limite. A situação está muito grave". Flávio Cardoso Pereira acredita que se houver vontade política e cidadã é possível reduzir muito os níveis de corrupção no País. Mas, destaca: "É uma ilusão a bandeira de que vamos acabar com a corrupção. Não há como se acabar com a corrupção tanto quanto não se consegue acabar com a prostituição, com as drogas..."
Ele também afirma que nem todo ato de corrupção é delito e que não é fácil definir corrupção. "Isso depende muito do que a sociedade tem de percepção daquela conduta. O que é corrupção aqui pode não ser no Alasca".
Pereira também se indigna com a inversão de valores em que ser honesta torna a pessoa uma celebridade e avisa que há muita infiltração do crime organizado dentro das instituições governamentais. "O que está acontecendo é a manipulação do Estado para promover sua própria transformação que são dos interesses criminosos. E o nosso País é muito pródigo, pois não temos uma real ideia da gravidade do problema das organizações criminosas".
Quando fala de "organizacões criminosas" ele não está se referindo às facções nos presídios. Mas, aos braços destas facções fora deles, infiltradas nas empresas e instituições. E também de organizações criminosas empresariais e governamentais. "E estas organizações cooptam servidores públicos para seus fins. Os remuneram atrativamente para isso".
Tudo isso está levando à quebra de confiança, nas instituições, nos governos, nos políticos. "Nós não temos noção da gravidade que é a quebra do pacto de confiança. E caminhamos para algo ainda pior, que é a quebra de confiança entre os cidadãos".
Sobre o instituto da delação premiada ele é categórico: "A delação premiada é feita por uma pessoa criminosa que se favorece de reduções de penas para entregar outros".
Ele finaliza dizendo que nunca imaginou que chegaríamos aos níveis de corrupção tão ramificadas nas empresas, nas instituições, nos governos, mas acredita que é possível mudar esse quadro. "O que devemos fazer é trabalhar políticas públicas que previnam e diminuam esses níveis de corrupção. O caminho não é combater, mas enfrentar a corrupção".
√ Direito penal e compliance
Fábio André Guaragni - Doutor em Direito das
Relações Sociais, com ênfase em Direito Penal, pela Universidade Federal
do Paraná (UFPR). Realizou estágio Pós-doutoral na Università degli
Studi di Milano (Itália). Procurador de Justiça do Ministério Público do
Paraná (MPPR). Professor universitário (UNICURITIBA, EMAP e FEMPAR) e
colunista da Escola Superior de Direito Público (ESDP). Autor de vários
livros.
"O empresário tem o dever de vigiar toda a estrutura contratada por ele. É o dever de vigilância". Com uma impressionante memória bibliográfica, Fábio André Guaragni discorreu sobre um tema complexo, mas que se compreendido e aplicado nas empresas, permite que esquemas de corrupção promovidos por algum membro da sua equipe possam ser devidamente punidos ou prevenidos.
Ele começa explicando compliance: "É um programa de cumprimento de normas externas e internas de uma estrutura empresarial que busca evitar ilícitos penais, extra - penais; busca forjar uma cultura interna de cumprimento de normas e evitar eventos que, embora não ilícitos, maculem de alguma maneira a imagem da empresa; e busca neutralizar desvios de comportamento ilícitos típicos do ser humano".
Durante a apresentação ele deu muitos exemplos da Lava - Jato e dos crimes atualmente em evidência no País. "A maior empresa brasileira, a Petrobras, não tinha um programa de compliance até esse episódio. O compliance tem por maior objetivo reforçar a confiança na empresa".
Apesar de o tema ser novidade para muitos da plateia, ele revela que o programa já existia na Idade Média. "Dois crimes ligados às origens da ideia do compliance de hoje já eram praticados e combatidos na Idade Média: Os crimes de falência fraudulenta e falsificação de produtos".
Sendo a atividade empresarial uma atividade de risco para si, para seus empregados, para os consumidores e para a sociedade, o empresário tem o dever de vigiar toda a estrutura contratada. "Tem que exercer o dever de vigilância".
Destaca ainda que numa empresa ninguém toma e executa decisões internas sozinho. "O empresário tem o dever de evitar resultados lesivos derivados de sua atividade empresária. Para o empresário não vigora o princípio da confiança, mas o da desconfiança, quando coloca outras pessoas para realizar atividades em seu nome".
√ A corrupção além fronteiras na sociedade de risco
Ricardo Guilherme Corrêa Silva - Doutorando em Direito
Público pela Universidade de Coimbra (Portugal). Mestre em Direito
Processual e Cidadania pela Universidade Paranaense (UNIPAR). Professor
Efetivo na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS).
Idealizador e colunista da Escola Superior de Direito Público (ESDP).
Proprietário do escritório Ricardo Guilherme Advogados (Dourados/MS).
"A corrupção pública, com a subtração do dinheiro público, caracteriza a grande corrupção, pois desvia recursos que seriam aplicados na educação e saúde, por exemplo, que penalizam milhares de pessoas e podem levar à morte, muitas delas".
Com foco na corrupção pública, Ricardo Guilherme Corrêa Silva começa seu mini curso dando como exemplo o estado do Rio de Janeiro. "Em 2016, os aposentados do RJ deixaram de receber suas aposentadorias pela falta de recursos. Pessoas que precisam comprar remédios, alimentos. A repatriação, neste ano, do dinheiro subtraído dos cofres públicos por Sérgio Cabral, foi direcionada ao pagamento de 135 mil aposentados".
Ele aponta que com o fenômeno da globalização o crime também não encontra mais barreiras. "Além dos recursos públicos serem depositados em paraísos fiscais noutros países, nossos computadores também podem ser facilmente invadidos por criminosos de outros continentes".
Esse quadro globalizante permite novas e modernas formas de criminalidade. No caso, a corrupção passa a ser internacionalizada. "Assim, o enfrentamento da corrupção não pode mais ser uma iniciativa isolada, mas conjunta, cooperada entre países".
Silva destaca que vivemos sob o medo dessas novas criminalidades e não estamos preparados para enfrentá-las. "Precisamos internacionalizar o combate ao crime, contar com a cooperação jurídica internacional e a união dos países para combater esses crimes. Isso é essencial".
√ Métodos ocultos de obtenção de prova e as garantias do processo penal
Geraldo Prado - Doutor em Direito pela
Universidade Gama Filho (UGF). Realizou estudos de pós-doutorado em
História das Ideias e Cultura Jurídicas na Universidade de Coimbra
(Portugal). Professor Associado da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ). Integrante de Comissão instituída pelo Ministério da
Justiça para Reforma do Código de Processo Penal. Desembargador
aposentado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ). Atualmente
se dedica à consultoria jurídica. É autor de vários livros.
"Eu não assisto televisão. É uma atitude que me parece de preservação da minha integridade mental". Com essa fala provocativa contra a manipulação televisa das massas, Geraldo Prado faz uma apresentação didática explicando a problemática entre a dimensão da realidade e o campo da verdade. Entre o evento real e o evento narrado sob o olhar subjetivo do observador e a complexidade de percepção e criminalização pelas narrativas.
Ele avança o olhar para a subjetividade particularizada quando exemplifica aquela situação em que um cirurgião precisa decidir entre uma freira e um criminoso, qual deles vai salvar; e diz que na prática a teoria é diferente.
"Quem instrumentaliza o processo penal faz diferenças, diferenças estas que não são muito visíveis na lei, que não estão claramente manifestadas na lei, mas que fazem parte do conjunto de conceitos com os quais nós trabalhamos".
Esta é uma das razões pela qual enquanto um menino da periferia flagrado com 20 papelotes é enquadrado como traficante, enquanto um menino classe média como usuário. "É evidente que a lei não faz essa diferença. Isso se faz no chamado campo subjetivo do conhecimento, da epistemologia subjetiva".
Além de fundamentar suas falas com seu notório saber jurídico e também fazer citações do momento atual de Lava - Jato, ele finaliza conclamando os presentes, principalmente os acadêmicos: "Saiam da armadilha. Desliguem a televisão. Se não puderem desligar a televisão, desliguem a Globo".
√ Aspectos polêmicos do acordo de cooperação premiada
Afrânio Silva Jardim - Livre-docente em Direito
Processual pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Procurador de Justiça aposentado do Ministério Público do Estado do Rio
de Janeiro (MPRJ). Professor Associado de Direito Processual Penal da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Autor de vários livros.
"Fora Temer". Coube a Afrânio Silva Jardim a palestra de encerramento do I Congresso de Ciências Criminais que iniciou conquistando grande aprovação da plateia ao saudá-la com um "Fora Temer", pedindo licença e desculpas aos que não concordassem com ele.
Citado e reverenciado pela maioria dos palestrantes que o antecederam, Jardim diz que a tendência hoje no Brasil é de ampliar poderes discricionários ao Ministério Público e também ao Poder Judiciário. "Eu acho incompatível com o Estado de Direito Democrático. A chamada justiça penal, justiça criminal, não deve ter poderes, ao meu ver, discricionários, e deve trabalhar com o princípio da legalidade".
Jardim discorre em sua palestra algumas incoerências da Lei 12.850 que permite a "delação premiada". Para se "beneficiar" dessa lei é preciso que o infrator seja integrante de uma organização criminosa. "Um assaltante não poderá usufruir dessa lei se ele não fizer parte de uma organização criminosa". E portanto, não terá direito ao perdão judicial (a lei prevê o perdão aos seus crimes) ou redução em até 2/3 na pena entre outros benefícios.
O que se vê acontecer nesse episódio da Lava - Jato é corruptos e corruptores de milhões de reais de recursos públicos sendo beneficiados com prisão domiciliar no conforto de suas mansões, apesar de terem causado estragos imensuráveis como o de inúmeras mortes (milhões destes desvios poderiam ter sido aplicados na saúde pública, por exemplo).
Mas, o que é muito grave, é que esta lei está sendo ampliada à revelia. "Sim, o juiz Sérgio Moro está ampliando benefícios que não estão previstos na lei, como por exemplo, suspensão de outros processos anteriores e até futuros contra o delator. Um processo futuro é outro crime! Isso está acontecendo".
Após enumerar diversos outros pontos controversos da lei, Jardim finaliza afirmando que a delação premiada está sendo mau aplicada. "Além de dar poderes absurdos está sendo distorcida. O processo penal atual agora virou negociata. Virou uma bagunça".
Os
idealizadores já estão articulando a realização do II Congresso de
Ciências Criminais. Uma iniciativa que deveria contar com o máximo de
apoio da sociedade, principalmente dos que estão ligados diretamente a
área do direito.