Seis dias antes da publicação oficial de cinco editais públicos, denúncia de “cartas marcadas” me foi apresentada.
Confira os fatos e veja o resultado no fim do texto abaixo.
O meio ambiente de Joinville acumula recursos. Já soma mais de vinte e cinco milhões de reais disponíveis no SISMMAM-Sistema Municipal de Meio Ambiente, como se pode conferir na Resolução 002/2015 do Comdema. A gestão Udo Döhler foi acumulando essa grana que poderia ter sido aplicada na promoção da educação ambiental na sociedade e na rede de ensino público e privado do município, por exemplo, como determina a Lei 5.712 de 19 de dezembro de 2006.
Mas, passados os três primeiros anos desta gestão e nenhum edital público fora lançado pelo setor. Aliás, foi sim! Às pressas e atropelado, pela primeira vez a sociedade pôde conferir, há poucos dias, o que vinha reivindicando desde 2013.
Contudo, o cumprimento das exigências e prazos dos editais publicados não eram para qualquer um! Talvez, para alguns, previamente “escolhidos”.
Senão, vejamos:
1- No dia 25 de novembro de 2015, às 18h, foi publicado, às páginas 101 a 104, no Diário Oficial Eletrônico o “Extrato SEI no 0195733; 0195765; 0195853; 0195863 e 0195872/2015-SAP.UPL.ACM”. Tratam-se dos “Extrato de edital de chamada pública-seleção de organização social para parceria-fundo municipal do meio ambiente”.
2- No dia 26 de novembro de 2015, alguns veículos de comunicação divulgaram notas, principalmente por conta dos relises oficiais da Prefeitura, sobre o referido edital.
3- No dia 27 de novembro de 2015 mais alguns veículos da mídia impressa noticiaram o fato e as redes sociais deram destaque ao mesmo. Foi durante este dia, sexta-feira, que algumas ONGs e Oscips, a exemplo do IVC-Instituto Viva Cidade, tiveram conhecimento do edital, puderam reunir parte de suas diretorias e decidir que buscariam mais informações para avaliar viabilidade de participação. Mas, aí já era sexta-feira...
4- No dia 30 de novembro de 2015, algumas entidades decidiram se lançar ao desafio de produzir projetos e viabilizar documentos exigidos pelo edital. Um desafio com mínimas chances de a grande maioria conseguir, pois o prazo final para entrega dos projetos com toda a documentação era às 14h do dia 09 de dezembro de 2015. Isso quer dizer que havia apenas oito dias úteis para se habilitar.
Como se confere no exposto acima, os editais são prioritariamente excludentes, sendo que deveriam ser o contrário. Uma denúncia que me chegara no dia 20 de novembro, de que editais seriam lançados pela SEMA com “cartas marcadas”, começava a ganhar credibilidade. Afinal, se alguma entidade não tivesse conhecimento do mesmo e de todas as suas exigências antecipadamente, dificilmente conseguiria produzir um projeto tão complexo e com enorme lista de documentos exigidos por estes editais.
Solícito, o ex-secretário Juarez Tirelli, alterou sua concorrida e ocupada agenda da sexta-feira de manhã (27 de novembro de 2015) e me recebeu para falar sobre o caso. Há que se registrar. Tirelli sempre, na sua gestão, atendeu todos os meus pedidos de entrevistas e nunca me deixou sem respostas. Pude, por conta disso, algumas vezes abortar denúncias vazias, infundadas e até criminosas de alguns que, se não pratico um jornalismo investigativo e comprometido com a ética, poderia ter noticiado acusações falsas contra sua administração junto à Fundema, depois SEMA.
Sobre editais, Tirelli me relatou que sua presença na secretaria tinha prioridades como a extinção da Fundema e criação da SEMA. Que esta mudança implicaria em complicadores para abrir editais e que no seu planejamento, depois da SEMA consolidada, os editais seriam lançados no início do próximo ano, 2016.
Mas, em novembro foram “pegos de surpresa” por uma orientação da Secretaria de Administração de que a Prefeitura estaria impedida de abrir os editais em 2016 por tratar-se de ano eleitoral. Para poder lançá-los e cumprir essa nova determinação as datas foram definidas de trás para frente no calendário de fim de ano com encerramento das atividades no dia 18 de dezembro.
Tanto Tirelli quanto sua equipe reconheceram o atropelo imposto pelos prazos que se obrigaram a cumprir e também pelo não completo domínio dos próprios editais.
Cumprindo todos os ritos legais com a participação do Comdema no processo e muitas horas de trabalho pós-expediente, sábados e domingos os editais foram publicados como relatado no início deste texto.
“Preferíamos publicá-los no início de 2016 para dar mais tempo à todos, tanto para nossa equipe quanto para os interessados em disputá-los. Mas, tivemos que cumprir a determinação da Secretaria de Administração”, ponderou-me o ex-secretário.
Sim. Porque Tirelli, no meio do processo do edital, pediu exoneração. “Fiquei dois anos. Cumpri com o que me comprometi com o prefeito. Dois anos é, para mim, o tempo ideal de trabalho numa atividade pública como essa”, simplificou assim a sua saída da SEMA, bem no meio do processo dos editais que disponibilizariam mais de R$ 25 milhões.
Quando conversamos no dia 27, disse a ele que socializaria as informações que me dera sobre dúvidas do edital à diretoria do IVC-Instituto Viva Cidade, entidade que atuo voluntariosamente como assessor de imprensa.
Feito isso, a Oscip, apesar de há oito anos disputar e conquistar editais públicos, decidiu produzir projeto e lançar-se ao desafio de viabilizar toda a documentação num prazo de apenas oito dias úteis.
Para tanto, contou com o apoio incondicional da equipe da SEMA que era visitada quase diariamente para tirar dúvidas de exigências pouco claras dos editais. Três grandes e aparentemente intransponíveis obstáculos se apresentaram: 1- Conquistar UPM-Utilidade Pública Municipal; 2- Alvará Sanitário e 3- Abrir conta corrente no BB ou na CAIXA, específica para o edital. Situações completamente novas, pela primeira vez presentes num edital que o IVC tivera contato.
1- A conquista da UPM só foi possível por conta do apoio dos vereadores envolvidos no processo e da equipe de funcionários do legislativo joinvilense. Em apenas oito dias o Projeto de Lei foi apresentado pelo vereador Rodrigo Fachini e, cada passo acompanhado pelo presidente do IVC, João Carlos Farias, até que finalmente, no dia 08 de dezembro, no período da manhã, também no executivo, todos os envolvidos no processo foram solícitos, destacando-se a iniciativa do próprio prefeito Udo Döhler que declinou do cerimonial de entrega do Certificado de UPM, como é praxe, para atender o prazo de urgência que expirava naquele dia.
Normalmente o processo de conquista de UPM leva semanas, quando não, meses.
2- Da mesma forma, o setor de Vigilância Sanitária cumpriu seu rito legal concedendo a referida isenção como prevê legislação específica. Normalmente o processo leva algumas semanas. Sim, porque não bastaria uma declaração dos dirigentes afirmando que o IVC é dispensado de alvará, como prevê lei específica.
3- A CAIXA, também, num prazo recorde abriu a referida conta bancária. Normalmente o processo leva algumas semanas. Tentamos no Banco do Brasil, não conseguiríamos atender as exigências no prazo. Em todos os editais locais, estaduais e federais que o IVC disputou, a abertura de conta só se dá após o resultado. Uma exigência inusitada destes editais da SEMA.
Secretário de Educação de Joinville, Roque Antônio Mattei (à mesa), recebeu,
com sua equipe do Núcleo de Educação Ambiental, o vice-presidente do IVC, Adilson Lopes da Silva,
e o parceiro do Instituto Lixo Zero, Gustavo Ritzmann, para firmar parceria ao projeto que disputou edital da SEMA
Apesar de tanto esforço com apoios documentais do Instituto Lixo Zero, Secretaria da Educação e Cia Águas de Joinville, parceiros do projeto que o IVC formulara para disputar o edital 004/2015, a entidade foi reprovada na primeira análise (documental). A principal razão foi não ter apresentado a cópia do comprovante de residência dos diretores da Oscip “autenticada”.
Decidiu, a diretoria, não contestar a decisão desclassificatória da SEMA, apesar de um dos editais ter sido facilmente impugnado por empresa de São Paulo, como se pode conferir no fim desta matéria.
A forma como está descrito no edital permite interpretar que não há exigência de autenticação na referida cópia (Resolução 003/2015 Comdema). O item 11.4.X diz que poderão credenciar-se os interessados que apresentarem os seguintes documentos no envelope: “cópia autenticada do Registro Geral – RG e do Cadastro de Pessoas Físicas – CPF dos dirigentes da entidade e comprovante de residência (atualizado)”.
Como está descrito, entende-se que o comprovante de residência não precisa ser autenticado, mas atualizado. E foi o que apresentamos, pois toda produção do edital estava custando caro para a Oscip que junta recursos de mensalidades de apenas cinco reais dos seus associados. E não desperdiçar esses recursos é regra, desde a sua fundação.
Em todos os outros editais que o IVC já disputou esse documento nunca teve exigência de ser cópia autenticada. E sua relevância é tão pequena em relação aos demais documentos que bastaria conferir pela internet a autenticidade ou pedir, a posteriori, o original. Mas, o IVC foi desclassificado por isso.
Se o texto fosse “cópia autenticada do Registro Geral – RG, do Cadastro de Pessoas Físicas – CPF dos dirigentes da entidade e do comprovante de residência (atualizado)” não teríamos dúvidas de que este também deveria ser autenticado.
Dois outros documentos também não estariam “de acordo” com o edital, mas “não foram decisivos na desclassificação”, segundo os técnicos da SEMA.
Como se pode conferir, uma entidade como o IVC, consolidada no profissionalismo para a prática do voluntariado ambiental, foi eliminada nesta disputa por um motivo que não valoriza a “razoabilidade”, disse outro especialista em selecionar e julgar projetos que disputam editais públicos em Joinville.
Imagine-se, então, as chances que teriam outras entidades sem a experiência que tem o IVC! Foi o que se confirmou. Mínimo de participação na disputa, pois sabiam as entidades que não teriam chances. Pelo menos duas outras, com relevantes serviços prestados no voluntariado, nem se lançaram ao desafio por essa conclusão... Uma delas foi parceira do projeto do IVC, o Instituto Lixo Zero.
A denúncia que me chegou de que era só esperar o edital ser publicado para a confirmação, se se considerar tantas dificuldades impostas e decisões pouco razoáveis, pode-se manter a suspeição. Mas, a investigação que fiz, até aqui, parece confirmar que tudo se complicou por conta dos prazos impostos pelo edital. E isso sim, ainda não conseguimos entender.
Tanto a equipe da SEMA quanto os milhões de cidadãos brasileiros melhores informados sabem que há uma lei que impõe restrições de contratações de serviços e compras pelo poder público em ano eleitoral. Trata-se da Lei 9.504/97, conhecida como Lei Eleitoral, que define claramente as vedações aos agentes públicos no período ou ano em que são realizadas as eleições. E nenhuma delas proíbe a realização de licitações.
As vedações referem-se explicitamente a matérias como publicidade institucional de órgãos públicos, cessão e utilização de bens públicos, nomeação, contratação e demissão sem justa causa do servidor público, transferência voluntária de recursos públicos da União aos Estados e Municípios, dentre outras.
E a Lei Complementar 101/2000, mais conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal é mais específica em seu artigo 42: “É vedado ao titular do Poder ou órgão referido no art. 20, nos últimos dois quadrimestres do seu mandato, contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para este efeito”.
Desde que assumiu a SEMA tenho deixado recado para ouvir o secretário Romualdo França. Bem diferente de seu antecessor, até a data e hora desta publicação não tivermos retorno, apesar de nossa insistência.
Dirigentes de diversas entidades estão se mobilizando para cobrar do prefeito Udo Döhler o lançamento de novos editais no primeiro quadrimestre de 2016. Segundo o presidente do IVC (Instituto Viva Cidade), se os editais forem publicados na segunda quinzena de fevereiro, por exemplo, tem-se todo o mês de março para produzir o projeto e documentos. “E até o dia 31 de abril para selecionar, contratar os aprovados e dar início às suas demandas”, explica o administrador João Carlos Farias.
E nada impede que os editais sejam publicados na primeira quinzena de fevereiro, considerando que já estão prontos e pouca alteração/correção se precisaria fazer.
Uma empresa de São Paulo impugnou o edital 002/2105 e o anulou. Todos os demais poderiam ser impugnados e anulados, pois têm o mesmo vício de origem.
O prefeito Udo Döhler tem sido cobrado por representativa parcela da sociedade, pois quando candidato dizia que o problema na Prefeitura não é falta de dinheiro, mas de gestão. Este episódio parece confirmar o discurso do candidato. Só na SEMA, são mais de vinte e cinco milhões em caixa, que podem ficar lá, parados por mais um ano, para o próximo prefeito.
Veja mais sobre os 5 editais em questão:
Univille conquista edital 001/2015 da SEMA
Edital 002/2015 da SEMA é impugnado por empresa de São Paulo e anulado
Univille conquista edital 003/2015 da SEMA
Instituto COMAR conquista edital 004/2015 da SEMA
Nenhuma entidade disputa edital 005/2015 da SEMA
Veja mais sobre outros projetos vitoriosos do IVC em disputas de editais públicos ou em parceria com outras entidades:
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